O mês de setembro traz destaque para a prevenção ao suicídio, mas é possível e importante ampliar as discussões sobre um tema relacionado a isso, de grande relevância para as empresas: a conexão entre a saúde mental e a diversidade no ambiente de trabalho.
E essa não é apenas uma questão de respeito ao ordenamento jurídico e Compliance, mas é também essencial à promoção de um ambiente de trabalho saudável, produtivo e inovador.
Questões jurídicas
Na Justiça do Trabalho, atualmente, há muitos processos que discutem casos de assédio moral, homofobia, racismo, desigualdade de gênero, contratação de pessoa com deficiência, bem como doenças ocupacionais de cunho psicológico, a exemplo da Síndrome de Burnout. Tudo isso pode estar interligado no caso concreto e tudo isso tem estrita relação com a dignidade da pessoa humana, fundamento da República Federativa do Brasil, conforme previsão da Constituição Federal de 1988[1].
No aspecto, observa-se que a legislação vem evoluindo ao longo do tempo, de maneira mais específica em cada tema, relacionando-o também ao trabalho. Por exemplo: a) Em julho de 2015, a Lei 13.146[2] instituiu o Estatuto da Pessoa com Deficiência e destacou disposição que já estava na Constituição, no sentido de que é dever do Estado, da sociedade e da família assegurar à pessoa com deficiência a efetivação de diversos direitos, dentre eles, o direito ao trabalho, à dignidade, ao respeito e à liberdade; (b) Em janeiro de 2022, a Organização Mundial da Saúde (OMS) passou a considerar o Burnout (síndrome do esgotamento profissional) como doença ocupacional, e fez a inclusão da síndrome no CID-11; (c) Em julho de 2023, a Lei 14.611[3] trouxe a disposição de que a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função é obrigatória.
Como dito, esses são apenas exemplos de questões de diversidade, equidade e inclusão destrinchadas pela legislação infraconstitucional em relação ao trabalho.
Assédio moral
Nesse contexto, vale lembrar que a discriminação por qualquer motivo no ambiente de trabalho pode caracterizar o assédio moral, definido por um tipo de violência psicológica que se configura por meio de conduta abusiva, quando, de forma reiterada e sistemática, um ou mais empregados são expostos a situações constrangedoras e humilhantes, interferindo na liberdade, na dignidade, na honra e nos seus direitos de personalidade[4]. O assédio moral pode ocorrer no ambiente de trabalho (e não raras vezes ocorre) por meio da atribuição de apelidos, ou com a reiteração de piadas sutis com o viés racista, homofóbico ou machista, por exemplo.
Esse tipo de conduta não apenas causa um prejuízo financeiro à empresa, na medida em que atribui a ela o dever de indenização, mas também é capaz de tornar a atmosfera insustentável, com consequências ainda mais graves relacionadas ao aspecto emocional não somente do colaborador vítima, mas de todos ao redor, desequilibrando a coletividade, prejudicando o bem-estar dos empregados em geral, e impactando na produtividade.
Vale dizer que, muitas vezes, a discriminação tem origem na falta de conhecimento ou em vieses inconscientes.
O que são vieses inconscientes?
Vieses inconscientes são pensamentos moldados por padrões mentais automáticos, e não pela razão, uma vez que a mente humana trabalha por meio de associações, às vezes ignorando informações lógicas. Isso gera ações, comportamentos e julgamentos influenciados pelo pensamento coletivo e pelas experiências passadas, traduzindo-se em generalizações enraizadas em estereótipos armazenados na memória, afetando as nossas condutas de forma aparentemente natural.
É fundamental entender que todos nós somos suscetíveis a vieses inconscientes, devido à nossa condição humana. E, ao reconhecermos esses vieses, podemos nos manter mais alertas para identificar situações em nosso dia-a-dia em que preconceitos estão influenciando o nosso pensamento e o nosso comportamento. Assim, passamos a entender que não é natural ou engraçado falar certas coisas ou tomar certas atitudes, sobretudo no ambiente de trabalho, onde se reúnem pessoas de famílias, lugares e culturas diferentes.
Prevenção
Não se pode esquecer que é dever da empregadora e dos empregados colaborar para a saúde no trabalho, e, entendendo o impacto de condutas que desrespeitam as diferenças, isso pode e deve ser inserido na cultura da empresa.
É de extrema importância que as pessoas entendam que são diferentes entre si e, por outro lado, que o respeito e a empatia geram aproximação. Uma cultura inclusiva no ambiente de trabalho pode aumentar a criatividade e a inovação nas organizações, uma vez que pessoas de origens e histórias diferentes podem ter opiniões distintas e trazer ideias e soluções diversas, o que, por conseguinte, pode impactar na produtividade e na inovação.
Diante deste cenário, as empresas podem e devem implementar políticas que promovam a diversidade, a equidade e a inclusão, promover palestras e treinamentos regulares, estabelecer canais de denúncia eficazes, oferecer programas de apoio à saúde mental, e realizar processos seletivos abertos para profissionais com perfis diferentes, lembrando que uma equipe heterogênea tem maior potencial de inovação.
A saúde mental e a diversidade no ambiente de trabalho estão interligadas e merecem atenção, e promover um ambiente inclusivo e saudável não apenas é uma responsabilidade ética, mas também uma necessidade para o sucesso das organizações modernas.
[1] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm
[2] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13146.htm
[3] https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/lei/L14611.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%2014.611%20DE%203,1%C2%BA%20de%20maio%20de%201943.
[4] https://www.tst.jus.br/documents/10157/55951/Cartilha+ass%C3%A9dio+moral/573490e3-a2dd-a598-d2a7-6d492e4b2457