Muitos brasileiros vivem há anos em imóveis que, embora ocupem regularmente, não estão registrados em seus nomes. Essa situação é passível de regularização via usucapião, instituto jurídico que permite ao possuidor adquirir a propriedade do bem, desde que atendidos os requisitos legais.

Tradicionalmente, o reconhecimento da usucapião exigia o ajuizamento de uma ação judicial e, sendo deferido o pedido, a sentença era posteriormente levada ao cartório de imóveis para o registro da propriedade.

Contudo, os processos judiciais de usucapião são morosos e costumam se arrastar por muitos anos. Como alternativa mais ágil e menos burocrática, foi introduzida pela Lei 13.105/2015 a opção de usucapião extrajudicial, viabilizando a regularização diretamente em cartório, conforme previsto no artigo 216-A da Lei nº 6.015/73 (Lei de Registros Públicos).

  1. Requisitos gerais e específicos da usucapião

Os requisitos básicos para a usucapião, seja pela via judicial ou extrajudicial, são os seguintes:

  1. a) Posse mansa, pacífica e ininterrupta: o possuidor deve exercer a posse de forma contínua, sem oposição ou interrupções, e sem que tenha iniciado essa relação por meio de violência ou precariedade.
  2. b) Posse com animus domini: é necessário que o possuidor aja como verdadeiro proprietário, cuidando do bem, realizando benfeitorias, pagando impostos e demais encargos. A posse sem animus domini — como no caso do locatário — não gera direito à usucapião.
  3. c) O bem não pode ser público: bens pertencentes ao poder público são insuscetíveis de usucapião, conforme dispõe a Constituição da República.

O tempo de posse é também um dos requisitos essenciais para o reconhecimento da usucapião. Contudo, o período exigido varia conforme a modalidade de usucapião pretendida e é acrescida de outros requisitos específicos. Veja os principais casos:

  • Usucapião extraordinária: 15 anos de posse com os requisitos básicos; ou 10 anos, se houver moradia habitual ou a realização de obras ou serviços produtivos.
  • Usucapião ordinária: 10 anos com justo título (como um contrato de compra e venda particular) e boa-fé; ou 5 anos, se houve aquisição do imóvel com registro posteriormente anulado, desde que o possuidor resida no local ou tenha realizado investimentos sociais e econômicos.
  • Usucapião especial urbana: 5 anos de posse ininterrupta, sem oposição, em área urbana de até 250 m², para moradia própria ou da família, desde que o possuidor não possua outro imóvel. Pode ser concedida a homem, mulher ou ambos, independentemente do estado civil.
  • Usucapião especial rural: 5 anos em área de até 50 hectares, utilizada para moradia e com produtividade pelo trabalho próprio ou da família.
  • Usucapião familiar: 2 anos de posse exclusiva de imóvel urbano de até 250 m², em caso de abandono do lar por ex-cônjuge ou ex-companheiro. Esse direito é concedido uma única vez.
  1. Procedimentos para a usucapião extrajudicial

Para utilizar o procedimento extrajudicial, além de atender aos requisitos da modalidade escolhida, o interessado deve comparecer ao Cartório de Notas para lavratura da Ata Notarial de Usucapião Extrajudicial, apresentando a documentação exigida.

O ato deve ter participação obrigatória de um advogado, que será responsável pela elaboração do requerimento de usucapião extrajudicial que deverá incluir a justificativa da modalidade de usucapião requerida, com base nas características do imóvel e da posse exercida.

Na solicitação da usucapião extrajudicial, o requerente deverá apresentar os documentos que comprovem os requisitos básicos e específicos para o reconhecimento da propriedade, notadamente a posse contínua pelo tempo necessário, o exercício da posse como se dono fosse e a realização de benfeitorias ou utilização do imóvel para moradia (conforme o tipo específico de usucapião alegado).

Ademais, o requerente deverá apresentar memorial / planta do imóvel, assinado por profissional habilitado e acompanhado da ART (Anotação de Responsabilidade Técnica). Esse documento deve ser assinado também pelos confrontantes, com reconhecimento de firma, demonstrando que não há disputa possessória.

Vale ressaltar que a usucapião extrajudicial pressupõe a ausência de litígio sobre o imóvel, não podendo ser utilizada esta via quanto houver qualquer disputa com terceiros ou confrontantes. Nesse sentido, o requerente deverá apresentar as certidões negativas dos distribuidores da comarca onde o imóvel está localizado e do domicílio do requerente para comprovar a ausência de disputa judicial sobre o bem.

O oficial do cartório de registro de imóveis analisará toda a documentação apresentada e, estando tudo em conformidade com os requisitos legais, será realizado o registro da propriedade em nome do requerente. Documentos adicionais podem ser solicitados pelo tabelião, conforme sua discricionariedade, para a suficiente demonstração dos requisitos legais para o reconhecimento da usucapião.

  1. Vantagens da usucapião extrajudicial

A usucapião extrajudicial apresenta diversas vantagens em relação ao procedimento judicial. Trata-se de um processo mais ágil, que permite ao possuidor regularizar o imóvel em menor tempo. Além disso, envolve um custo financeiro reduzido, tornando-se uma alternativa mais acessível.

Outro ponto positivo é que a adoção da via extrajudicial para o reconhecimento da usucapião contribui para a diminuição da sobrecarga do Poder Judiciário, transferindo para o cartório um procedimento que, antes, exigia a atuação judicial.

Por fim, amplia significativamente o acesso à regularização fundiária e à formalização da propriedade, promovendo maior segurança jurídica e inclusão social.

 5. Considerações finais

A busca pela segurança jurídica nas relações patrimoniais é essencial para a prevenção de litígios e a garantia do pleno exercício dos direitos. Nesse sentido, é fundamental contar com orientação jurídica adequada e recorrer a cartórios de confiança, garantindo um processo transparente e seguro.

A possibilidade de regularizar a propriedade por meio da usucapião extrajudicial é uma importante inovação legislativa, que alia eficiência e celeridade, contribuindo para a efetivação de direitos fundamentais.