A relação entre empregado e empregador é de natureza contratual, o que faz com que seja necessária, em boa parte dos atos que envolvem as duas partes, que haja a manifestação de ambos, para que sejam válidos os atos jurídicos praticados. É o que ocorre quando da celebração do contrato de trabalho ou quando da sua extinção, por exemplo.
E com relação aos cartões de ponto? São eles que trazem as jornadas de trabalho dos empregados e são, com certeza, o objeto que gera o maior número pedidos em ações trabalhistas, as horas extras.
A obrigatoriedade do controle de jornada decorre da disposição do art. 74, § 2º da CLT que dispõe ser obrigatório para os estabelecimentos com mais de 20 (vinte) trabalhadores a anotação da hora de entrada e de saída, em registro manual, mecânico ou eletrônico, conforme instruções expedidas pela Secretaria Especial de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, permitida a pré-assinalação do período de repouso.
Com efeito, em nenhum momento a lei dispõe para que sejam válidos os registros de frequência, a necessidade de serem assinados pelo empregado e, diante da omissão, muitas são as discussões que chegam à justiça neste sentido.
Recentemente, a Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho declarou a validade dos cartões de ponto sem a assinatura de um auxiliar de operação de uma empresa do ramo de concessão Metroviária do Rio de Janeiro. Consequentemente, determinou que na apuração das horas extras levem-se em conta os horários ali registrados, inclusive quanto aos meses em que os controles de frequência não se encontram assinados. A decisão foi proferida no julgamento do recurso de revista da empresa, ao qual foi dado provimento pela Turma do TST.
O juízo de primeiro grau tinha condenado a empresa a pagar horas extraordinárias quanto aos meses em que os controles de ponto não estavam assinados.
Ao julgar o caso, o TRT manteve a sentença, declarando inválidos os registros de ponto. Para isso, considerou que o reconhecimento da validade dos registros de frequência somente atingiria os documentos assinados pelo empregado. Conforme o acórdão do Tribunal Regional, sem a chancela do empregado, os registros de frequência são meros controles unilaterais do empregador, sem validade.
No recurso ao TST, a empresa sustentou a falta de dispositivo de lei que exija o controle de horário assinado pelo empregado para lhe emprestar validade.
E, segundo o relator do recurso na Primeira Turma, “a exigência de assinatura do empregado no cartão de ponto carece de previsão legal, razão pela qual não pode ser invalidado como meio probatório e, consequentemente, transferir o ônus da prova para a empregadora”. Para
chegar a esse entendimento, ele se baseou no artigo 74, parágrafo 2º, da CLT.
O caso citado acima é um dos inúmeros exemplos do entendimento majoritário do TST quanto ao tema; mesmo assim, vários juízes de primeiro grau e alguns tribunais, tem se posicionado em sentido contrário.
O entendimento, a nosso ver, adequado, é aquele do TST, no sentido de que a apresentação dos controles de jornada pelo empregador gera a presunção de veracidade da jornada ali registrada, conforme prevê a súmula 338, itens I e II, independentemente se serem eles assinados ou não.
Outra base para referido entendimento está no fato e que a Portaria 671 do MTE, que substituiu a Portaria 1510, embora possua uma seção específica para tratar do controle de ponto, determinando como devem ser registrados, em nenhum momento dispõe sobre obrigação de assinatura.
Neste ponto, vale lembrar que existe uma série de exigências nesta Portaria para a utilização dos sistemas eletrônicos de controle de ponto que servem exatamente para garantir a integridade dos registros, o que torna ainda mais inaceitável a exigência de assinatura pelo empregado, como obrigação adicional, sem base legal para tanto.
Nesta situação, é fato que cabe ao empregado o ônus de prova de que os horários lançados não são reais, independentemente da assinatura dos mesmos.
Repita-se, não há na CLT ou em portarias do Ministério do Trabalho, qualquer dispositivo que exija que o cartão de ponto seja assinado; neste sentido, não há a obrigação de assim proceder; ademais, como dito, o TST entende que a ausência de assinatura, por si, não é suficiente para afastar a validade dos registros inseridos nos controles de jornada.
Em não havendo lei que determina a assinatura dos cartões de ponto para sua validade, requisito apenas formal, a exigência como pressuposto de validade dos mesmos ofende o princípio da legalidade, insculpido no art. 5º, II, da Constituição Federal, no sentido de que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei;
Já, contrariamente ao entendimento mencionado acima, há, na mesma súmula 338, em seu item III, outra situação. É aquela dos cartões de ponto que trazem horários de entrada e saída uniformes, os chamados “cartões britânicos”.
Nesta situação, totalmente diversa da tratada anteriormente, eles são considerados inválidos como meio de prova, mesmo se tiverem assinados, com inversão do ônus relativo a horas extras, que passa a ser do empregador, prevalecendo a jornada informada na inicial, se dele não se desincumbir.