Em decisão recente proferida pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, de forma unânime, ficou definido que o Brasil é competente para julgar ação de indenização por danos morais, em virtude de prejuízos em investimentos realizados em fundo no exterior.
No caso concreto, ficou evidenciado nos autos que uma cliente do Banco Itaú Unibanco S.A. teria sido instruída a adquirir uma empresa nas Ilhas Virgens Britânicas e, posteriormente, orientada a aplicar os recursos da empresa em um fundo de investimentos, fato que teria levado os investidores à ruína, com um prejuízo superior a U$ 2.000.000,00 de dólares.
Em virtude do prejuízo suportado, a cliente e a empresa ingressaram com Ação de Indenização por Danos Morais contra o banco, a qual foi julgada no Brasil.
O Banco Itaú interpôs Recurso Especial perante o STJ, alegando que a justiça brasileira seria incompetente para conhecer e julgar a lide, uma vez que a empresa recorrida e o Banco Itaú Europa Internacional estão situados em território norte americano e que todas as operações financeiras questionadas no processo foram realizadas nos EUA. Ademais, alegou serem as instituições financeiras situadas no Brasil e nos EUA, pessoas jurídicas distintas.
O Relator do REsp nº 1366642, Min. Luis Felipe Salomão, esclareceu que o Novo Código de Processo Civil manteve a mesma sistemática do código anterior no que se refere à competência e aos limites da jurisdição nacional.
Afirmou o Relator que o caso dos autos se amoldava à hipótese do parágrafo único, do art. 21 do CPC/15[1], podendo a demanda, inclusive, ser julgada pelas justiças brasileira e estrangeira, sem que haja o fenômeno da litispendência[2].
Sobre o tema, destacamos a doutrina do Prof. Humberto Theodoro Júnior, veja:
A competência da Justiça brasileira, em face dos tribunais estrangeiros, pode ser:
(a) cumulativa;
(b) exclusiva.
Os arts. 21 e 22 do novo CPC9 enumeram casos em que a ação tanto pode ser ajuizada aqui como alhures, configurando, assim, exemplos de jurisdição cumulativa ou concorrente.
Assim, pode a ação ser proposta perante a Justiça brasileira (embora nem sempre seja obrigatória tal propositura), quando (art. 21):
[1] Art. 21. Compete à autoridade judiciária brasileira processar e julgar as ações em que:
I – o réu, qualquer que seja a sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil;
II – no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;
III – o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil.
Parágrafo único. Para o fim do disposto no inciso I, considera-se domiciliada no Brasil a pessoa jurídica estrangeira que nele tiver agência, filial ou sucursal.
[2] §1º, do artigo 337, CPC/15: “Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.”
(a) o réu, qualquer que seja sua nacionalidade, estiver domiciliado no Brasil (inciso I);
(b) no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação (inciso II);
(c) o fundamento seja fato ocorrido ou ato praticado no Brasil (inciso III).
(…)
Nas hipóteses de competência concorrente (NCPC, arts. 21 e 22), a eventual existência de uma ação ajuizada, sobre a mesma lide, perante um tribunal estrangeiro, “não induz litispendência e não obsta a que a autoridade judiciária brasileira conheça da mesma causa e das que lhe são conexas, ressalvadas as disposições em contrário de tratados internacionais e acordos bilaterais em vigor no Brasil” (art. 24).18
Nada impede, portanto, que a ação, em tal conjuntura, depois de proposta em outro país, venha também a ser ajuizada perante nossa justiça, salvo se já ocorreu a res iudicata, pois então será lícito
à parte pedir a homologação do julgado para produzir plena eficácia no território nacional (art. 960).19
(Theodoro JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil, Vol. 1, 47ª Ed. Ano 2016, Editora Forense)
No processo ficou demonstrado que, em que pese estar a empresa situada no exterior, inúmeros atos foram praticados ainda em território brasileiro, como a remessa de dinheiro aos EUA, a compra da sociedade empresária, ligações telefônicas para tratar do investimento e a possibilidade de ser fornecido suporte do gerente operacional do branco no Brasil, fato que comprova a “transnacionalidade contratual”, conforme disposição expressa do inciso III, do artigo 21 citado acima.
A cliente Recorrida conseguiu demonstrar nos autos que recebia orientações de investimentos do banco brasileiro e estrangeiro.
Por fim, concluiu o Relator que o Banco Recorrente Itaú possui domicílio no Brasil, fato que por si atrai a competência nacional para conhecimento e julgamento da causa, conforme inciso I, também do art.21 já citado.
Os ministros acompanharam o Relator e mantiveram a decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo.
Lays Pereira Coelho
Melo Campos Advogados
Data: 1º de novembro de 2016