Depois de não menos 42 anos de vigência, o Código de Processo Civil de 1973 está prestes a se despedir para dar lugar à tão esperada reforma processual, imprescindível à sociedade que, em razão de contínuas transformações e avanços, exige uma nova direção para a justiça.

Nesse sentido, destaca-se uma das importantes inovações do NCPC que, trazida pelo art. 333 da nova legislação, irá permitir a conversão da ação individual em ação coletiva nas hipóteses em que forem atendidos os pressupostos da relevância social e da dificuldade de formação do litisconsórcio.

Tal novidade permitirá que o Ministério Público, a Defensoria Pública e os legitimados previstos no art. 5º da Lei 7.347 e art. 82 da Lei 8.078 requeiram essa conversão aos litígios que afetam, ao mesmo tempo, as esferas jurídicas do indivíduo e da coletividade. Será permitida a conversão, ainda, nos casos em que tenha por escopo a solução de conflito de interesse relativo a uma mesma relação jurídica plurilateral, na qual, por disposição de lei ou pela sua natureza, deva ser essencialmente uniforme, proporcionando tratamento isonômico para os pertencentes do grupo.

Entretanto, a conversão não será admitida nos casos em que implicar a formação de processo coletivo para a tutela de direitos individuais homogêneos, além de o § 3º prever que tal instituto também não deverá ser aplicado quando (i) já iniciada a audiência de instrução e julgamento no processo individual; (ii) houver processo coletivo pendente com o mesmo objeto e (iv) o juiz não tiver competência para o processo coletivo que eventualmente se formaria.

Deferida a conversão pelo magistrado, poderá tanto o autor quanto o réu Agravar por Instrumento da decisão (art. 1.015, XII, do NCPC). Todavia, na hipótese de seu indeferimento, tal decisão será irrecorrível, cabendo ao interessado, neste caso, ingressar com a demanda coletiva.

Na primeira situação, o magistrado intimará o autor para que emende a inicial a fim de adequá-la à tutela coletiva. Em seguida, o Réu terá o prazo de 15 (quinze) dias para se manifestar. Cumpre esclarecer, nesse rumo, que o Autor da lide não será excluído, eis que atuará como litisconsorte unitário do legitimado para condução do processo coletivo, oportunidade em que ficará isento de quaisquer despesas processuais decorrentes da mencionada conversão.

Nos casos em que o autor tenha cumulado pedido de natureza puramente individual, o processamento desse pedido se dará em autos apartados, haja vista que, por ser exclusiva do autor originário, este será responsável por conduzir os atos processuais, bem como pelo pagamento de eventuais despesas.

Pois bem. Sobre tal instituto, cumpre destacar os impactos positivos de sua futura aplicação. Isso porque, as referidas mudanças poderão, sem sombra de dúvidas, proporcionar maior eficácia e celeridade na prestação jurisdicional. Tal novidade, ademais, poderá reduzir a barreira existente ao acesso à justiça, na medida em que muitas pessoas que não possuem condições de enfrentar uma demanda judicial complicada terão seus direitos, de fato, concretizados e acessíveis – não apenas proclamados.

Imperioso observar que, como bem reconhece Mauro Cappelletti, com o crescimento e o aumento da complexidade das sociedades do laissez-faire a definição de direitos humanos iniciou uma grande transformação. Essa transformação foi resultado de um contexto social em que os relacionamentos e ações assumiram, cada vez mais, caráter coletivo, momento em que a visão individualista dos direitos foi sendo deixada para trás.

A inovação trazida pelo Novo CPC abandona a visão de que o processo é um litígio com base eminentemente individualista, que visa à solução do imbróglio existente entre duas partes acerca de seus interesses próprios e particulares.

Sobre essa perspectiva, destaca de forma brilhante Mauro Cappelletti:

“A concepção tradicional do processo civil não deixava espaço para a proteção dos direitos difusos. O processo era visto apenas como um assunto entre duas partes, que se destinava à solução de uma controvérsia entre essas mesmas partes a respeito de seus próprios interesses individuais. Direitos que pertencessem a um mesmo grupo, ao público em geral ou a um segmento do público não se enquadravam bem nesse esquema. As regras determinantes da legitimidade, as normas de procedimento e a atuação dos juízes não eram destinadas a facilitar as demandas por interesses difusos intentados por particulares” (CAPPELLETTI, Mauro, GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Sérgio Antônio Fabris Editor. Porto Alegre: 1988, p. 19).

Além disso, a tutela coletiva é uma grande forma de desafogar o judiciário da quantidade exorbitante de processos judiciais individuais, pois poderá conter o ingresso de demandas que podem ser decididas em uma única sentença, contribuindo, assim, para uma prestação jurisdicional mais célere, eficaz e econômica.

Portanto, além de seus benefícios, esse novo avanço será um significativo instrumento de cidadania, sobretudo para aqueles que não podem ultrapassar as barreiras do acesso ao judiciário e da inclusão social, já que nem todos os titulares de um direito difuso podem comparecer a juízo a fim de garanti-los eficazmente.

Ana Clara Franco Laudares
MELO CAMPOS ADVOGADOS

Data: 09/03/2015